Essa
semana, me deparei com uma possibilidade ao mesmo tempo incrível e
infeliz. A possibilidade de um novo lar para o homem. Na noite da última
quarta-feira, meu coração bateu acelerado quando li que, na tarde do
dia seguinte, a Agência Espacial Norte Americana (Nasa) faria um
importante comunicado. Esperei por formas de vida unicelulares em Titã
ou em algum outro ponto do sistema solar, uma nova descoberta da New
Horizons, além da cauda de Plutão, ou notícias das nossas queridas sondas Voyager, com os discos de Carl Sagan
nos limiares do sistema solar ou além (whoa, baby! Estamos explorando o
espaço!!!). A notícia foi veiculada logo cedo: uma Terra 2.0.
Batizada de Kepler 452b,
descoberta pelo satélite Kepler, a Nova Terra, se for mesmo rochosa,
apresentará muitas das características do nosso planeta. Aproximadamente
60% maior que o nosso pálido ponto azul, ela leva cerca de 385 dias
para girar em torno do seu sol particular, uma estrela pouco mais de 1
bilhão de anos mais velha que a nossa e também um pouco maior. A
distância entre o novo lar e o forno atômico que o aquece também é
proporcional, isto é, trata-se de um planeta na "zona habitável", com
uma temperatura que garante água em estado líquido (desde que haja água
por lá). Pode ser um mundo parecido com o nosso, pode abrigar vida,
pode, um dia, ser uma base para a humanidade, quando nos lançarmos às
novas grandes navegações.
Kepler
452b fica a cerca de 1.400 anos luz da terra. Isso significa que,
viajando à velocidade da luz, demoraríamos 1.400 anos para chegar lá.
Também significa que, se mirássemos um super-satélite para o novo lar,
um satélite tão poderoso que seríamos capazes de enxergar com clareza um
lagarto de três cabeças caçando na superfície selvagem desse mundo,
veríamos uma cena que aconteceu há 1,4 mil anos. Se, de lá, olhássemos
para a Terra, veríamos o império neo-babilônico a todo pano, no local que, hoje, chamamos de Oriente Médio. A meta, agora, seria descobrir como dobrar o espaço e atravessar um buraco de minhoca. Seria desenvolver a tecnologia adequada para a quase não fictícia animação suspensa. Seria iniciar um processo de colonização independente de um novo mundo. Já temos as desculpas que precisávamos para, audaciosamente, ir onde homem nenhum jamais esteve, mas, infelizmente, morreremos no "seria".
Espero
que essa descoberta valha a pena daqui a alguns séculos, pois no palco
da Terra, a tragicomédia que vivemos torna esse novo mundo bem mais
longe do que ele já é. Temos, em um lado da balança, um possível planeta
habitável e, no outro, uma velha, velha civilização. O homem merece
viver, ir além do que fomos até hoje, desbravar o Universo. Mas não o
homem do nosso tempo. Depredamos a terra a um ponto sem retorno,
brigamos, matamos e morremos em nome de fábulas chamadas religiões,
figuras imaginárias batizadas de deuses e linhas invisíveis denominadas
fronteiras. E fazemos isso há tanto tempo quanto conseguimos imaginar.
Falando
em imaginar, imagine que fôssemos capazes de, nos próximos anos,
desenvolver a tecnologia para chegar à Kepler 452b. O que faríamos com
um mundo maravilhosamente novo, que coloca a vida como algo, talvez,
banal no Universo, que nos tira do centro do mundo, que mostra que
existe ainda mais esperança de encontrar novos lares? Vale a pena viajar
toda essa distância para dar continuidade à nossa cultura vigente, ao
estilo de vida predominante no nosso planeta? Eis a nossa "cultura
vigente": extrair e destruir em nome de uma peça de teatro de muito mal
gosto, que consideramos o ápice da evolução; considerar-se superiores às
culturas que conseguem viver em harmonia com a Terra; desrespeitar
outras vidas, matá-las, destruir habitats, em nome de um lucro que não
valerá mais que 50 anos e que definitivamente, não tornará as coisas
melhores... Podia quebrar o Blogger só com essa lista.
As
vidas desse novo mundo, , levando em conta que existam, intactas a não
ser pelo processo de nascimento e morte que promove a evolução, teriam o
mesmo direito de existir que as da Terra. De crescer e se desenvolver
que as da Terra. Direito esse que violamos copiosamente. E, com isso,
estamos nos matando. Ano após ano. O que valeria mais, a extinção de m
novo planeta em um tempo, aposto alto, muito menor do que o que levamos
para dar início a um novo processo de extinção em massa
por aqui, ou a extinção da humanidade e a prosperidade da vida no
Universo? Se sumirmos, arrisco dizer, ninguém vai perceber. Lembro-me da
pergunta imaginada por Ismael, personagem de Daniel Quinn, se os
gorilas teriam chances de sobreviver em um mundo sem os homens. A
humanidade não vale tanto quanto um planeta "novinho em folha".
Mas, ainda assim, podemos caminhar em direção à essa estrela, a esse planeta, em uma corrida de 1.400 anos luz. Podemos porque podemos.
A caminhada começa aqui e agora. Temos que chegar lá. Nossa vida é
muito preciosa. A caminhada, na verdade, começa hoje. Agora. Enquanto
escrevo esse texto. Enquanto você lê. A caminhada começa com a demolição
dos velhos fundamentos da cultura vigente. Começa com a humildade de
olharmos para as nossas culturas mais primitivas e aprendermos com elas.
Começa por descartarmos deuses, religiões e consolos. Não existe
consolo. Na natureza, como disse um velho filósofo amigo meu, não existe
perdão. A caminhada começa de um por um, não para que um homem alcance a
nova terra, levando consigo o ambicioso individualismo, mas para que
uma espécie o alcance, tornando o Universo um lugar menor e, ao mesmo
tempo, maior. A caminhada começa nesse exato instante, para que humanos
melhores possam aterrissar na nova e fina atmosfera. Pense em espécie.
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