"Isso
é idealismo juvenil, utopia. Quando você estiver mais velho,
compreenderá." Perdi as contas de quantas vezes eu ouvi essa frase na
minha adolescência. Hoje, guardo meus arroubos idealísticos para mim.
Quando muito para a Paula, para o PP
ou para o Blog. O que eu ganho com isso? Bem, não me considero recluso
ou retraído. Não penso que faço isso para não evitar ouvir essas sábias
recomendações sobre como as coisas não devem ser mudadas. Acredito,
sinceramente acredito que estou amadurecendo minhas ideias. Ideias
políticas, humanistas, filosóficas e até científicas (guardadas as
devidas limitações). Todos têm direito de ter ideais. Todos têm direito
de querer mudar as coisas e de expressar isso livre e sinceramente, a
despeito da idade e das limitações do próximo.
Bem,
aconteceu! Estou mais velho. Minha forma de ver o mundo mudou e
continua mudando. Se não investi loucamente nos meus ideais
revolucionários, sou o principal responsável por isso. Se o mundo for
acabar por conta da minha letargia, admito, sou culpado. Mas exijo que
"os mais velhos" também assumam sua parcela, por bombardear mentes
juvenis em chamas com baldes de água fria e acusações infundadas de
inexperiência e desejos utópicos. Isso me deixa maluco. Tenho uma filha.
Linda. Nove meses. Fico imaginando como será o mundo em que ela irá
crescer e as dificuldades que enfrentará. Sonho que ela seja leitora
ávida, e que faça algo de útil para a humanidade, afinal de contas,
estamos precisando. Sonho instigá-la, caminhar ao lado dela, ouvir as
ideias mirabolantes e acusações efervescentes e apoiá-la. A vinda da
Olívia me trouxe à realidade. Com isso, me senti ainda mais impelido a
cultivar os meus ideais.
Sonho
em criar um ser humano melhor, para que o mundo possa ser melhor. É uma
ideia bem simples. O mundo precisa ser melhor, eu tenho o dever de ser
um cara melhor, e gastei e gasto minhas energias me embrenhando em um
sistema que trabalha para resolver os problemas do sistema e não das
pessoas. Em que os negócios são, e serão, sempre o mais importante de tudo, o
primeiro lugar. E não a espécie humana. Nos esquecemos de pensar como
espécie, tão frágeis quanto os gorilas e as borboletas. E, se pudermos
preparar os próximos seres humanos para serem melhores, já estaremos
fazendo algo de consistente pelas mudanças. Algo que governo nenhum,
escola nenhuma jamais farão. Algo que "os mais velhos" com certeza não
farão. Pois já sabem como a banda toca. Já sabem como funciona o mundo.
Já sabem. Já sabem e, por isso, não questionam, não duvidam, não mudam.
Bem, eu, aqui, aos 32, quase 33, preso à Terra do Nunca,
olho para trás e me lembro das duras palavras, muitas vezes proferidas
por pessoas confiáveis. Por pessoas que lutaram por um Brasil melhor na
década de 60 e 70. Quando eu crescer, eu vou entender. Era tudo utopia.
Ok. Eu, aqui, aos 32, quase 33, de aliança no dedo e casamento marcado,
cresci. O tempo passou mesmo. E me parece que passou bem rápido. O mundo
está pior. Bem pior. Tenho poucas razões para imaginar o contrário. O
aquecimento global está em um ponto sem retorno. A degradação da
Amazônia, igualmente. A humanidade é assolada pela miséria, pelas
guerras e pelo fanatismo religioso. Uma música distante e baixinha toca
na Europa: a trilha sonora das Grandes Guerras. O Brasil parece se
derramar aos encantos da serpente.
Nada mudou, pois eles, "os mais velhos", os piratas, sabiam como as
coisas funcionavam. Muita gente busca refúgio na esterilidade do
esoterismo ou no atraso medieval das religiões, e, enquanto rezam ou
proferem mantras, as coisas acontecem.
O
mundo mudou para pior. Mas e a utopia? Não era tudo utópico em meus
pensamentos? Que diferença faria, então, eu tentar mudar algo? Dizer que
um determinado raciocínio é utópico é uma maneira preguiçosa e indigna
de descartar uma ideia. As máquinas da revolução industrial são
resultados de ideias e testes de outros protótipos, que datam mais de
100 anos antes de um dos momentos mais criativos da história humana. O
primeiro conseguiu um instrumento, para nós, rudimentar, mas sonhou com
uma utopia à vapor. O segundo melhorou aquela invenção, com o mesmo
sonho. Hoje, essa classe de máquinas é ultrapassada e prejudicial ao
meio ambiente. Precisamos de ideias assim, mas para a espécie humana,
para que possamos sobreviver, salvar o planeta e explorar o espaço.
O
melhor das ideias é que elas não respeitam sexualidade, etnia ou
acúmulo de riquezas. A ideia, como objeto, comporta-se de maneira
"utópica". Ninguém, nem o pior dos totalitaristas pode deter a
criatividade, os sonhos, os pensamentos. Fluam eles como cálculos ou
poesias. Podem, no máximo, te fazer acreditar que têm esse poder. É o
que fazem os piratas quando dizem que os ideais dos jovens são como são
por inexperiência e inclinação às utopias. Tentam apagar a luz que não
podem roubar. Eu posso escutá-los. "Gancho! Gancho! Gancho! Gancho!"
Piratas! Quando alguém mais novo te apresentar um pensamento utópico, ao
invés de descartá-lo, ajude-o a questionar e refletir sobre o tema.
Certamente algo de jovem entrará em nós e nos ensinará coisas novas.
E
mais sobre a utopia... Não é utópico acreditar quer nosso sistema
prisional resolve o problema da criminalidade e da violência, que
precisamos de mais cadeias? Não é utópico pensar que reduzir a
maioridade penal vai ajudar a diminuir a criminalidade? Não é utópico
pensar que proibir os abortos fará com que as pessoas não abortem? Que
sua religião, dentre as milhares que existem, é a correta? Não é utópico
pensar que o capitalismo e seu irmão gêmeo, o comunismo, tem o poder de
resolver o problema da humanidade quando, em ambos os casos, eles estão
focados no ter, e não no ser? Em mudar os caras que controlam as
coisas, e não em mudar o homem? São essas as utopias dos piratas, dos
"mais velhos". As utopias podem ser belas e terríveis. Principalmente
quando acreditamos nelas sem entendê-las, questioná-las, revisá-las,
revistá-las.
No
amadurecimento de minhas ideias não encontrei a chave para todos os
nossos problemas. Mas, aprendi que é preciso questionar. Se questionar.
Duvidar é fundamental. Que é preciso, a todo tempo, testar a firmeza e a
realidade das próprias crenças. Aprendi a não esperar ajuda vinda de
fora. De outro planeta ou de outro mundo. Não seremos ajudados. Estamos sozinhos nessa.
Nós e os bilhões de espécimes da Terra, que tem tanto direito de estar
aqui quanto a raça humana. Ah! Aprendi, também, que nós somos os
políticos. Que a política é feita de gente. Que os ladrões na Câmara
Legislativa, dos Vereadores ou dos Deputados são nossos representantes
porque se candidataram e nós votamos neles. Parece óbvio, mas não é. O
óbvio é invisível aos olhos. Porque eu não me candidatei? Ou minha mãe,
que se envolve com a política há décadas? Ou você? Bem , esses são
nossos representantes. E você pode dizer que um ou outro não lhe representam, mas representam sim. Foram eleitos em um processo
democrático que você participou, ainda que seja votando nulo.
Aprendi,
ainda, que os piratas acusam os idealistas porque eles representam a
transformação, a mudança, o tempo. E o crocodilo das horas os perseguem
com seu apavorante "tique-taque".
E aprendi, por último, que esse crocodilo é insaciável, e persegue
também aos sonhadores, e persegue, com os dentes em riste, a nossa
permanência aqui na terra. Urge agir, urge mudar, urge sonhar...
Tique-taque, tique-taque, tique-taque...
Excelente texto! Concordo em gênero, número e grau. E tudo isso porque somos todos "coxinhas": http://caosdoxa.blogspot.com.br/2015/07/somos-todos-coxinhas.html
ResponderExcluir(hehehe... momento merchan).
Vou excluir seu comentário. Brincs! Vou não. Somos mesmo, todos coxinhas. :)
ResponderExcluirCapitão, quando recebi seu telefone para anunciar que você e Paula seriam 3, minha alegria foi multiplicada por saber desse legado que Olívia ganharia. Por saber que as gerações futuras terão alicerces mais humanos (no sentido que não nos envergonhe).
ResponderExcluirQue a Terra do Nunca nunca seja apagada dos corações!
Que a coragem reme destemida.
Quanto fôlego em um sopro só! Quantos ganchos não querem roubar nossos sonhos...estão em toda parte. Mas a gente tenta voar que nem Peter Pan...O maior problema é quando a gente, sem nem se dar conta, acaba se tornando outro gancho por aí! Outro grande texto, Luiz!
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