No documentário Capitalismo, uma história de amor, Michael Moore dá início ao filme de forma magistral, com uma série de cenas de assaltos e um documentário antigo da Enciclopédia Britânica
sobre a vida na Roma Antiga (!?). "Roma era a mais bela cidade do mundo
antigo", começa o narrador. Em seguida, ele fala sobre como a fachada de
grandeza escondia "sementes de decadência". A medida que o narrador
avança, Moore intercala as cenas de Roma com imagens dos Estados Unidos.
Se você não viu, brinque de imaginar. Se já viu, tente adaptá-las ao
seu país, à sua realidade. Economia dependente de escravos, disparidade
entre ricos e pobres, proliferação de favelas, pouca mobilidade social,
entretenimento para divertir a população (corridas e lutas!), ditaduras,
funções de um governo eleito pelo povo que esbarram em autoridades
superiores, governantes irresponsáveis...
"Pergunto-me como nossa sociedade será vista no futuro. Nós seremos julgados por isso?", questiona nosso querido Michael assim que a introdução da Enciclopédia Britânica chega ao fim. Não vim aqui para falar de capitalismo. Vim para falar de um tema que ocupa um grande espaço da minha mente há muitos anos: a ficção científica, ou, se preferirem, o sci-fi! O que Moore faz, basicamente, é mostrar que os sinais de decadência da Roma Antiga estão bem claros na nossa sociedade. Os problemas amplamente estudados do passado se repetem em um mundo, muitos concordarão, em decadência. O documentário faz uma crítica ao Império Romano. Nossa cara pensar naqueles povos de antigamente, tão inferiores. Mas o que seremos daqui há cem anos? O que os documentários da Enciclopédia Lestásia dirão sobre esse povo rústico nas telas de uma televisão diferente da que conhecemos hoje, projetada por um equipamento pequeno sobre um aparador, por sua vez, não tão diferente dos que vemos hoje? Eles dirão: "Hail to the big brother!".
Quando Moore coloca
nossa sociedade submissa aos julgamentos de um povo do futuro, ele quase
faz uma concessão à ficção científica que emerge das nossas
imaginações. No livro O Mundo de Sofia, Jostein Gaarder faz um desafio.
Imagine uma coisa que nunca existiu! Imagine agora! Você não precisa.
Ela nunca existiu. Tudo o que imaginamos, do mais absurdo e perturbador
ao mais trivial, por mais inédito que seja, é feito com base em
referências do que conhecemos. A terrível face de Cutulo
nada mais é que a mistura de um elefante e de uma lula? Possivelmente.
Assim é o futuro tal qual imaginamos. Projeções e misturas de nosso
presente e passado. Desnecessário dizer que a ficção científica
apresenta variados cenários? Nem tanto. Não precisa ser necessariamente
sobre o futuro, por exemplo. Pode ser um "passado" mais avançado que o
nosso. Isso é perfeitamente possível. A Europa retrocedeu no tempo após a
queda do Império Romano. O Islã radical, hoje, também nos ameaça com um
retorno forçado à tempos de barbárie. E levamos muito tempo para
reaprender como levar as pedras das pirâmides sobre a fofa areia do deserto.
Podemos
falar de um presente que se mescla, de alguma forma, com o futuro. Nos
filmes de invasão alienígena, o ser humano precisa desenvolver ou
compreender e dominar a tecnologia intergalática. Seja para vencer a
ameaça, seja para fins pessoais, como aconteceu em Distrito 9, do genial Neil Blomkamp. Na trama, os humanos promovem um apartheid aos camarões.
A história faz referência a uma condição humana e a um momento político
cruel da nossa história, e ainda traz à tona reflexões sobre A
Metamorfose de Kafka (não vou colocar link aqui, apenas para obrigá-lo a
procurar o livro por conta própria, se ainda não tiver lido). Outro
cenário, o futuro próximo ou distante também nos coloca em uma posição
diferente, para enxergarmos outro ângulo da caixa na qual estamos
presos. As obras de Philip k. Dick,
que inspiraram clássicos do cinema como Blade Runner e O Vingador do
Futuro são muito boas em levar os seres humanos para a degradante
situação de colonos, por exemplo, e a lidar com problemas criados a
partir de soluções pensadas à curto prazo (Bin Laden, é você?). E o
grande mestre da ficção científica, o bom doutor Isaak Asimoov (achou
que eu não fosse falar dele, não é?) vai além quando, na trilogia
Fundação, mostra uma humanidade em vias de se deteriorar, e que sequer
se lembra do passado em uma onírica Terra (nada a ver com a nossa
história!).
Há na ficção científica a fina poesia do presente. A realidade é o óleo viscoso que banha as engrenagens da máquina do tempo. O portal interdimensional que transporta a imaginação ao nosso mundo, que se abre quando apertamos o play ou abrimos um velho livro sobre o amanhã que estava empoeirado nas nossas estantes. As mentes mais simplórias tomam a pílula da iniciação científica.
O que eu quero dizer é que com um pouco de imaginação, podemos
chacoalhar a caixa para descobrir o que há lá dentro. Podemos entrar na
toca do coelho. Se o objeto se arrasta ou se rola. Se faz barulhos
estridentes ou graves. A ficção científica nos traz a oportunidade de
olhar diferente, de mudar as nossas perspectivas para compreender o
presente, para evitar os erros do passado e para sonhar com dias
melhores, de modo a alcançar esses sonhos. Se vivemos, hoje, tempos
comparáveis ao do declínio e queda do Império Romano, como serão os
tempos vindouros? O que perderemos nos giros para trás desse terrível construto chamado História? Logo agora, que estamos tão perto de uma
nova fase de exploração do espaço!
As religiões brigam entre si pelo monopólio da origem dos homens. Mas a verdade está lá fora.
Enquanto guerreamos por fantasias e linhas imaginárias chamadas de
fronteiras, "na adolescência da humanidade", como diria a radioastrônoma
Eleanor Arroway, o espaço frio e fantástico nos aguarda. O mundo é fabuloso em si. A
Terra é pequena demais para ambições tão mundanas quanto as da nossa
sociedade, mas é a base perfeita para nos lançarmos ao espaço, ao
futuro, ao amanhã. Basta que estejamos unidos. Impossível não lembrar
Carl Sagan, quando o cientista e divulgador olha para o ser humano com
esperança. “Nós que não conseguimos nem colocar nosso próprio lar
planetário em ordem, divididos por rivalidades e ódios, havemos de nos
aventurar no espaço afora? Quando estivermos prontos para morar no mais
próximo dos sistemas solares, teremos mudado. Não seremos nós que
alcançaremos Alpha Centauri. Será uma espécie muito parecida conosco, porém
com mais de nossas forças e menos de nossas fraquezas. Mais confiante,
visionária, capaz e prudente.” Pense em espécie.
Até o amanhã...
Só não existe aquilo que a gente não inventa. Bom texto mestre!!!
ResponderExcluirSó não existe aquilo que a gente não inventa. Bom texto mestre!!!
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