Ozymandias
(Percy Bysshe Shelley
Traduzido por Tomaz Amorim Izabel)
Conheci um viajante de antiga terra
que disse: – Duas pernas destroncadas, pétreas,
estão no deserto. Perto delas, soterra
a areia meia face despedaçada,
cujo lábio firme e poderio de olhar, frio,
diz que seu escultor bem lhe leu as paixões
que sobrevivem, nas meras coisas sem vida,
à mão que zombou e ao coração que nutriu.
E no pedestal tais palavras aparecem:
“Meu nome é Ozymandias, o rei dos reis:
Vejam minhas obras, ó fortes – desesperem-se!”
Nada resta: junto à ruína decadente
e colossal, de ilimitada aridez,
areias, lisas e sós, ao longe se estendem.
(Percy Bysshe Shelley
Traduzido por Tomaz Amorim Izabel)
Conheci um viajante de antiga terra
que disse: – Duas pernas destroncadas, pétreas,
estão no deserto. Perto delas, soterra
a areia meia face despedaçada,
cujo lábio firme e poderio de olhar, frio,
diz que seu escultor bem lhe leu as paixões
que sobrevivem, nas meras coisas sem vida,
à mão que zombou e ao coração que nutriu.
E no pedestal tais palavras aparecem:
“Meu nome é Ozymandias, o rei dos reis:
Vejam minhas obras, ó fortes – desesperem-se!”
Nada resta: junto à ruína decadente
e colossal, de ilimitada aridez,
areias, lisas e sós, ao longe se estendem.
Como a timeline de uma rede social, as conversas com amigos muitas vezes nos puxam para o redemoinho dos fatos mais recentes e (nem sempre) relevantes da cidade, do país ou do mundo. Vence quem argumenta melhor? Vence quem tem mais razão? Vence quem está do lado do bem? Não. Ninguém vence. Não é uma luta. Não é uma disputa. É apenas uma conversa saudável entre amigos ou parentes. Podemos até dizer quem ganha. Não vence, mas ganha, quem mais acrescenta ou quem mais aprende.
Uma boa conversa está entre minhas coisas favoritas na vida. Não tenho muitos problemas em ceder, mudar de opinião ante um ponto de vista melhor que o meu, mais profundo (mesmo que tenha que lutar contra o incômodo desapego de ideias). Fico instigado e feliz quando os dois (ou mais) participantes do bate-papo mudam de opinião. Quando os participantes percebem os próprios pontos fortes e fracos e como podem se completar e encontram uma terceira via. E acho incrível, por fim, quando os interlocutores concluem que discordam fundamentalmente de opinião, mesmo que o fim almejado seja o mesmo. E a vida segue. E diante dos tempos turvos em que vivemos, é preciso somar mais, entender mais, e apegar-se menos às ideias.
Questionar, duvidar, mergulhar em um sem fim de entendimentos e tomar conhecimento de argumentos contra e a favor fazem parte da busca pela compreensão ou pela familiarização com um tema. E é importante lembrar que estar familiarizado com um assunto não significa conhecê-lo (e que ambos são importantes). Fico confuso com a quantidade de textos, vídeos e opiniões que recebo sobre a crise política, por exemplo. E é por isso (e sobre isso) que estou escrevendo agora. Ou estou confuso apenas pela falta de domínio sobre o tema, ou porque é tudo muito confuso mesmo. Talvez seja um pouco de cada, mas a segunda opção certamente tem um peso maior.
Acho que, nesse momento, deve ser difícil para todo mundo pensar com distanciamento sobre o que está acontecendo no país. Acredito que a primeira missão de cada indivíduo revoltado é sair da dinâmica do nós contra eles e tentar enxergar a coisa de outra forma. Sem o diálogo, não vamos a lugar nenhum. No meu caso é um desafio pensar friamente por ter crescido, sido educado em uma família petista. Estou decepcionado com os rumos que o partido tomou nos últimos anos e, há tempos, luto para descolar minhas ideologias da imagem do PT. Me identifico com a posição política de esquerda e nada me diz que devo mudar isso. Trabalho, no entanto, para reciclar minhas ideias, conceitos e preconceitos. Não é fácil. Não é simples. E não vai ser fácil pra ninguém, mas esse é o momento ideal para esse tipo de transformação (mesmo que a pessoa defenda este ou aquele lado do discurso maniqueísta da crise).
Para lidar com temas tão difíceis, orgânicos, mutantes e, por diversos motivos, confusos, é preciso encontrar lugares seguros para pisar enquanto se avança (no entendimento e também no debate). O avanço será lento. O resultado final dos pensamentos de cada indivíduo, arrisco dizer, é o desejo do país avançar e se livrar de tão antigos e renováveis veios de corrupção. As pessoas querem avanço econômico, câmbio estável, moralidade política, segurança, saúde, educação, emprego e o país em crescimento (pode adicionar o seu desejo para o país aqui ……….....…………….). Todo mundo quer um mundo melhor (mas algumas pessoas só querem ver o circo pegar fogo). Como disse um amigo, o problema é que todo mundo sabe o caminho e sabe quais são as melhores opções, quando não a única via para a “salvação”. E quando todo mundo é super, ninguém mais é.
Precisamos desenvolver novos hábitos de humildade e sede de entendimento e conhecimento. Mais uma vez, de desapego às ideias. Precisamos ouvir mais e falar menos. Não falo do silêncio obediente, mas do reflexivo,que antecede uma nova ideia, uma crítica bem elaborada ou uma reflexão em terrenos desconhecidos e cada vez mais reconhecidos. Ao receber uma nova informação, é preciso fazer mais perguntas que afirmações e, diante da dificuldade em compreender o tema e de avançar nesse sentido, mudar o ângulo de visão, sair da caixa, determinar o que ele (o tema) não é antes de afirmar o que ele é. Ao menos se a pessoa quer pensar por si só.
Quando leio notícias, assisto ou ouço jornais ou leio artigos, encontro dezenas de informações tendenciosas de todos os lados. Elas fazem parte do processo e é bom lê-las e questioná-las todas. Além disso, os rumos dos acontecimentos mudam em uma velocidade alucinante. Tenho sentimentos e percepções conflitantes, as vezes contraditórias sobre tudo o que está acontecendo. No presente momento, não acredito em todos os argumentos do ataque e acredito menos ainda nos de defesa. Considero precipitado fazer afirmações taxativas, ter certezas e encontrar fórmulas e líderes nesse cenário. Somente no fim de tudo é que poderemos avaliar com mais segurança mais a eficiência e a ineficiência de tudo que foi feito e desfeito durante a Operação Lava-a Jato (essa seria a grafia correta?), pela Polícia Federal, pelo Ministério Público e pela Justiça.
O que penso então? Fiz, para mim, um conjunto de perguntas e respostas que me ajudam a tatear na névoa da crise política. É pessoal, mas vou colocar aqui mesmo assim. Sob o risco de ouvir uma boa crítica, acrescentar mais respostas ou trocar algumas por melhores e, ainda, acrescentar novas dúvidas. É preciso ir com a operação da Polícia Federal até o fim? Sim. Minuciosamente. Com o máximo de cuidado. É preciso fazer exemplos e coibir a corrupção? Fazer exemplos eu não sei. Me parece algo emocional demais. Mas, sim. É preciso coibir a corrupção. É preciso fortalecer as instituições e acabar com a cultura da impunidade política no país? Sim. É preciso investigar todos os envolvidos, sem exceção? Sim. E condená-los? Somente após o julgamento. Lembrando que fazer Justiça não é se vingar, mas aplicar uma reparação ao crime e uma pena restritiva/educativa ao culpado.
E sobre o PT? O PT tem grande participação nesses crimes? Me parece que sim. O PT é o partido que mais roubou? Não sei. Levando em conta que roubou, é preciso saber desde quando roubou. Se foi desde o início do governo Lula, ainda assim é preciso saber por quanto tempo os militares roubaram o país. Até agora, o PT está há 13 anos no poder. Os militares ficaram 21. Talvez o PT seja o segundo no ranking de tempo, mas o primeiro em eficiência. Mas, como as coisas mudaram, é preciso saber quanto foi roubado e qual foi a eficácia das articulações e institucionalizações de corrupção e compará-las. Porém, se a avaliação for proporcional, será necessário fazer o mesmo levantamento com o Governo FHC, com o Itamar, com o Collor e com Sarney. Até porque as notas podem mudar se vistas proporcionalmente. É preciso avaliar todo mundo, investigar todo mundo, punir todos os culpados, mesmo que o PT vença no quesito quantidade/estrutura. É preciso saber de onde veio, onde realmente está e para onde vai essa roubalheira. É preciso retirar os cabeças e impedir o surgimento de novos e piores.
Continuando… O PT é vítima de uma conspiração? Duvido muito. O PT é responsável pela crise financeira do país? Me parece que sim. Ao menos em partes. Os deputados e senadores da oposição fabricaram a crise para comprometer a governabilidade e tirar o PT do poder por meio de um golpe? Não, mas eles agravaram a crise financeira (ainda que, talvez, não fosse necessário). O impeachment é a única saída? Não sei, mas não consigo ver condições de a Dilma se manter no poder. Qual seria a melhor saída para a Dilma na minha opinião? Uma renúncia, mas não nutro expectativas quanto a isso. A saída do PT vai resolver o problema da nação? Não. O que está acontecendo é um golpe? Não sei. Acho que não. Mas e se for? Se for, já deram o golpe. Com o aval de quem está no poder. Com ou sem Dilma, com ou sem PT, os próximos anos serão difíceis. Perdão pelo pessimismo. E o Cunha? Tem que cair. E o Temer? Se a Dilma cair, tem que cair junto. E o Aécio? Não. O Aécio não assume. Sinto muito. E terá que pagar pelo envolvimento dele também. E o Lula? Tem que ser investigado e, se atrapalhar as investigações, tem que ser preso por obstrução da Justiça. Se julgado e considerado culpado, tem que ser preso. Todos os envolvidos devem ser investigados, presos preventivamente se for necessário, julgados e condenados (ou inocentados) de acordo com as provas e como deveria acontecer qualquer brasileiro médio envolvido em um crime.
E tem mais… O que está acontecendo no Congresso e no Planalto é a moralização da política? Ainda não. Algumas vezes, me parece uma disputa irresponsável por poder falsamente legitimada pela operação da PF e uma consequência natural do atual estágio de podridão da nossa política. O processo como um todo, então, é inválido? Como um todo, não. Vejo como algo praticamente inevitável no presente momento, e que, espero, trará melhores frutos (mas não necessariamente bons).Tragaremos o amargo por um bom tempo. A situação vai melhorar com a saída do PT? Não dá pra saber. Acho que vão continuar ruins por uns tempos, mas por um período de tempo menor do que se o PT continuar no poder. Quem assumir o governo será um salvador? Putz! Não! Existe algum salvador para o país? Não me sacaneia. É claro que não. Não temos ninguém para assumir o poder e o problema é que isso também não justifica a continuidade do PT no poder. Será um terrível “não tem tu vai tu”, a partir de agora. A Lava-a Jato acabará com a corrupção no país? Não creio. Ela é uma investigação contaminada pela política e pela disputa irresponsável de poderes? Talvez. Ela já deu certo? Ainda não. Não acabou. E também não sei se dará, e se não der, será muito, muito grave para as instituições. Será um atestado que nada mudou. Será um atestado que toda essa desgraça que está desempregando famílias não passou de um teatrinho de troca de poderes.
Imagem meramente ilustrativa |
Nada é preto e branco nessa história. Tudo tende muito mais para o mal gosto dos 50 tons de cinza. Não é que esteja finalmente acontecendo o correto, mas que as pessoas estão buscando esse caminho (o que também não significa que tenham encontrado). Procurei dar respostas simples, para ser o mais assertivo o possível sobre o que penso e consigo compreender do que está acontecendo com o país. Foi até onde avancei, eu acho. Individualmente, busco uma via externa ao conflito, focada em resolver toda essa bagaça. A gente ainda vai sofrer muito os efeitos das más escolhas da atual gestão, mesmo muito tempo depois de eles terem deixado o poder (ainda este ano, no ano que vem ou em 2018). A gente ainda vai sofrer muito com a crise econômica. Mesmo depois das eleições, arrisco dizer. E pode (provavelmente vai) sofrer ainda mais com as decisões de quem assumir o poder, seja quem for essa pessoa. Politicamente e economicamente.
E tudo isso que eu disse pode cair por terra amanhã ou depois. As coisas podem mudar ainda mais e mais rapidamente do que estão mudando. Novas máscaras podem cair. Se não atingirmos o coração da hidra, as cabeças continuarão se multiplicando. Tolo de quem tomar partido dessas cabeças. É preciso questionar, achar uma via de diálogo de esquerdas e direitas, rumo ao crescimento do país. É hora de reconhecer, de corrigir, de assumir, de conversar. Não há santos à esquerda ou à direita. Para quem, como eu, sente um duro pesar, pois parece-me, as vezes, que me roubaram a esperança por uns tempos, é um momento bom para avançar com as ideias, reformá-las, fortalecê-las, de se reinventar. Rever as concepções de mundo, de certo, de errado. Tem mais chance de fazer isso quem não se julga o prumo da inteligência. Quem sabe que erra, que pode estar errado.
À esquerda, com os cumprimentos do PT e seus caciques, bossais que roubaram às custas da vida de milhares de militantes que deram o precioso tempo ao partido, pseudopolíticos que sorveram como vampiros desses idealistas cheios de vontade, à esquerda, vilipendiada pelo maior de seus representantes, resta catar os cacos, contar os mortos, traçar um novo plano, com velhas e novas ideias, e recomeçar. À direita, surge a oportunidade de rever posturas, de se oxigenar, de se modernizar e se desvincular de determinados líderes e posturas (dentro de mim, nesse momento, gritam milhares de vozes incapazes de acreditar que a nossa direita aproveitará dessa maneira o momento). É hora de romper, de mudar, de tirar o melhor desse terrível pântano no qual nos enfiamos voto a voto, eleição a eleição, partido a partido, líder a líder. Agora, se ficar todo mundo gritando e brigando igual torcida de futebol, ladrando ferozmente as “boas intenções”, a caravana vai passar, e ficaremos todos. E será muito pior que avançar aos tropeços.
Excelente texto!
ResponderExcluir