"Quando eu te encarei frente a frente não vi o meu rosto
Chamei de mau gosto o que vi, de mau gosto, mau gosto
É que Narciso acha feio o que não é espelho..."
Chamei de mau gosto o que vi, de mau gosto, mau gosto
É que Narciso acha feio o que não é espelho..."
(trecho da canção "Sampa", de Caetano Veloso)
"Ah, meu caro Narciso... por que tiveste que se apaixonar pela própria imagem?... Por que não foste capaz de olhar alem de ti próprio e de admirar todo um mundo ao teu redor?... Não és perfeito, Narciso... Ah, meu caro Narciso... por que vejo em ti o meu reflexo?"
Por favor, admirem este último
parágrafo, de minha própria autoria... (aplausos)... Obrigado! Pois bem, hoje,
tentando pensar sobre um tema para escrever, tive que sair (um pouco) de meu narcisimo
e pedir sugestões. Eis que me sugerem falar sobre o próprio narcisismo. Soou-me
interessante, ainda mais depois de meu último texto aqui no blog, que refleti
sobre os rótulos
sociais. Então, obrigado pela sugestão, Rodrigo! Cá estou eu.
O termo narcisismo vem do
personagem da mitologia grega chamado... Narciso,
cujo fato principal do mito é que ele, inicialmente indiferente ao amor, acaba
se apaixonado pela própria imagem e, ao tentar alcançar o seu próprio reflexo,
acaba por definhar-se ante busca inalcançável. Ao lembrar desse mito, fiquei
refletindo sobre os nossos narcisismos, que ocorrem desde pequenas coisas no
cotidiano, até a busca de uma suposta perfeição, que na verdade se trata de
querer encontrar algo ou alguém exatamente como nós.
É natural de todo ser humano
querer uma unidade em todas as coisas, ou seja, uma relação harmônica entre
tudo e todos. Esta seria a perfeição tão buscada: no trabalho, tudo dá certo;
em casa, ela está limpa e organizada; não temos conflitos com as pessoas, damo-nos
bem com todas etc etc...
No entanto, esbarramo-nos ante
uma questão: somos todos diferentes e as coisas não são ou os fatos ocorrem sempre
da forma que queremos. Há que se levar em consideração que cada um possui
necessidades de experiências diferentes, desejos distintos, e ainda um karma diferente, como diria a
tradição hindu, tudo visando de alguma forma a unidade.
O maior problema ocorre quando
entram dois defeitos humanos entram nessa história: a vaidade e o orgulho.
Aparentemente semelhantes, considero estes defeitos a principal característica
do narcisismo e os grandes os vilões para essa busca da unidade. Em poucas
palavras, a vaidade é o sentimento de que somos melhores, pois sabemos bem algo
ou fazer algo e sobrevalorizamos isto. No orgulho, não necessariamente sabemos
algo, e mesmo assim nos achamos os mais importantes, e todo o mundo ao meu
redor deve ser como eu quero e tudo tem que ser para mim. Em ambos os casos há
o “enamoramento” por nós mesmos, o que nos faz ser indiferente aos outros, gera
desprezos e preconceitos, assim como o belo Narciso era ante às ninfas
apaixonadas por ele.
O narcisismo impede-nos de ver os
fatos como deveriam ser ou de ouvir as pessoas; impede-nos de reconhecer nossos
erros e de aprender; impede-nos de estabelecer uma harmonia, uma boa convivência
com tudo e todos. Impede-nos de estabelecer uma unidade, dentro dessa bela
multiplicidade em que vivemos.
Ninguém será igual a outro, seja
em questões físicas ou emocionais ou mentais (pensamentos). Por isso não
deveríamos julgar tão rápido uma pessoa por causa de uma roupa que ela veste ou
algo que ela fala. Não sabemos o que está por trás da história dela, e o que
ela pensa e é de fato. E, também, o mundo não gira ao nosso redor; nós é que
giramos com ele. Deveríamos aprender a entrar nessa harmonia, como uma peça de
uma engrenagem de um relógio, para que este funcione perfeitamente.
Enquanto cada um ou cada grupo
quiser a perfeição somente para si, os conflitos continuarão. Difícil vencer
isto? Sim. Não é fácil largarmos de nossas vaidades e nossos orgulhos, pois estes
defeitos têm sido colocados para cada um de nós como uma forma de vida. Há que ver
além dos próprios reflexos; há um belo mundo para se ver.